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Um alô para o colorismo

É complicado, para mim, falar sobre o dia 20 de Novembro. A data em si, carrega muito significado. Homenagem à morte de Zumbi dos Palmares, símbolo na luta contra a escravidão no Brasil. Dia de orgulho, aceitação e reconhecimento de identidade. Acredito que cada pessoa experimente as cargas dessa data de uma maneira diferente, mas comigo nunca foi tão fácil.


Para você que está lendo isso ter o mínimo de contexto, sou negro de pele clara, comumente tido como pardo. E por que isso seria algo relevante neste texto? Justamente porque minha experiência com aspectos ligados à negritude e vivência racial são diferentes das experiências e vivências de pessoas negras retintas, ou seja, de pele mais escura.


O Dia da Consciência Negra, pra mim, sempre foi uma questão. Consciência racial para pessoas de pele clara é uma questão nesse país (um alô pro colorismo). Para negros, eu não sou negro. Para brancos, definitivamente não sou branco e tem mais, sou o “café-com-leite”, o “moreninho queimado de sol”. Já ouvi de pessoas brancas, em tom extremamente pejorativo que no dia 20 de Novembro eu podia me reunir com a minha família para falar dos tempos bons que tivemos na África. Já ouvi de pessoas negras que eu não podia me posicionar no dia 20 porque isso mancharia o movimento, já que não sou negro e o que valia do meu discurso era só a empatia.


Me entender negro foi um processo complicado, e em algumas instâncias, ainda é. Habitando este lugar de “não-raça”, passei anos negando meus traços, ancestralidade e sim, negando minha própria pele. Pessoas da minha família, mais retintas que eu, insistiram em me dizer que não somos negros. Pessoas brancas ao longo da minha vida me fizeram entender que por mais que eu não fosse o negro da pele preta, eu não fazia parte dos mesmos espaços que eles.


Em minha vivência, não foi só na raça que me impuseram limites injustos. Ser bissexual também foi para mim – e às vezes, ainda é – um desafio. Sexualidade e raça são coisas completamente diferentes, porém, correlatas. É comum que dentro da comunidade LGBT+, nós bissexuais encontremos adversidade no ato político de autoafirmação. A sociedade nos enxerga promíscuos, vetores de doença, loucos por menage, pessoas confusas, no meio do caminho entre a hetero e a homossexualidade, passando por uma fase de descoberta, monossexuais experimentando e a lista continua. Invisibilizados, apagados, constantemente corrigidos e mal interpretados, patologizados e completamente esquecidos, habitando um lugar de “não-sexualidade”.


Entender minha sexualidade e me empoderar do fato de que ser bissexual não é estar entre duas coisas, mas sim ser uma sexualidade própria, com suas diversas possibilidades e que o que diziam sobre isso era apenas um equivoco, me fez parar pra pensar que talvez eu não habitasse um lugar de não-raça. Assim como não há apenas uma maneira de ser bissexual, por vezes não entendemos que não há apenas uma expressão de negritude e que pessoas negras são também, diversas.


Minha bissexualidade é válida. Minha negritude também é. Ter consciência disso, entendendo as especificidades que dizem respeito a minha pele e como isso me insere na sociedade, poder celebrar o fato de SER é algo fantástico e apesar de ainda complicado, é necessário e importante dizer: também sou negro, também existo, esse dia também foi feito pra mim.

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